Notas do Autor - Capítulo 30
Pelos velhos tempos
Três dezenas de capítulos!
Capítulo 30, finalmente! Este é um
grande marco não só para mim, enquanto escritor, mas também ara a narrativa em
si. Sinto que este é o verdadeiro começa da Temporada 2, onde cada personagem
começa a assinalar os seus próximos objetivos. E temos muitas metas por
alcançar!
Acho muito interessante a forma como
a minha própria escrita tem evoluído. Sinto que atualmente é uma coisa mais
metódica e prática. Sinto que consigo ser mais fluído. Não preciso
necessariamente de escrever o capítulo pela ordem em que as coisas acontecem.
Na verdade, aprendi a escrever as cenas de forma individual, coligando-as
depois de todas estarem escritas. E quando não me sinto inspirado, simplesmente
não forço o processo. O facto de atualmente escrever em ficheiros guardados na cloud
também me ajuda a ter mais acesso à “folha” de escrita. Posso escrever em todo
o lado e aproveitar os pequenos raios de inspiração que surgem em momentos
aleatórios do dia. Outra coisa que tenho vindo a reparar: pode se dever à minha
experiência e paixão pelo audiovisual, mas cada vez que escrevo imagino a cena
a acontecer na minha cabeça. Serei doido?
Quero agradecer a todos os leitores
que se mantêm presentes desde o início desta aventura. Sem vocês isto não faria
qualquer sentido. Vamos a mais 30?
O trio protagonista está de volta
A conversa que os três tiveram
durante o pequeno-almoço era um ponto necessário, uma espécie de check-up,
antes de continuar em frente. É importante que todos eles saibam que cresceram
e evoluíram enquanto estiveram separados. Porém, o mais importante é que a
amizade continua a uni-los.
Depois de várias conversas
interrompidas, Victor, Gloria e Hop têm finalmente uma refeição a sós,
tranquila e sem interrupções. E percebemos que Hop está de regresso ao grupo.
Tinha o seu discurso final escrito há algum tempo e guardei-o até este momento.
Entrar na cabeçade Hop e perceber o seu ponto de vista é uma tarefa complexa,
mas sempre bastante interessante. Confesso que ele é um dos personagens que
mais gosto de trabalhar graças aos seus conflitos internos.
Na minha cabeça, a última cena foi bem
calorosa e perfeita para fechar este arco. Espero que tenham sentido o mesmo.
Até já, personagens secundárias!
Bede, Marnie, Avery e Klara foram
personagens presentes nos últimos capítulos da nossa história. Aos poucos,
vemos estes quatro elementos crescerem e revelarem-se ao público. Mas, por
agora, chegou o momento de os voltar a abandonar. Prometo que em eles voltarão
muito em breve! E, alguns deles, com narrativas muitos interessantes por
explorar…
Sonia VS Raihan
A primeira aparição de Raihan já
estava a ser planeada há algum tempo e este pareceu-me o momento ideal para o
fazer. Aproveitando a presença de Sonia, apresentamos um pouco da amizade entre
estas duas personagens que já partilharam tantas histórias no passado. É
através dos dois que revisitamos a história do The Darkest Day, visitando um
sítio emblemático de Hammerlocke.
A batalha entre os dois mostra-nos
que, apesar da amizade, nenhum deles baixa os braços quando o objetivo é
vencer. É claro que Raihan, enquanto Líder de Ginásio, tem mais experiência que
Sonia. No entanto, o confronto entre os amigos de longa data também é marcado
pelo reencontro dos seus Pokémon. E… surpresa! Ivysaur evoluiu para Venusaur!
Fiz uma grande reflexão sobre quando este momento deveria ocorrer e este
pareceu-me a melhor altura. Vamos lá, equipa de Sonia!
E… Leon
Sim, é verdade. Quando comecei a
planear este capítulo, não estava nos meus planos incluir uma cena com Leon.
Porém, as peças foram-se encaixando. Numa capítulo com a presença de Sonia e
Raihan, que mencionam e falam tão abertamente de Leon, achei que seria a
oportunidade perfeita para o revisitar. Até porque ainda não o tínhamos
explorado após a grande discussão do Capítulo 25.
A verdade é que Leon está a
afundar-se nos seus próprios pensamentos. E, como pudemos perceber com a ajuda
de Rose, as suas prestações de batalha também estão a sofrer as consequências.
Porém, o Campeão insiste em não revelar o que realmente se passa a Rose.
Acredito que isso se deva a uma facto muito simples: depois de desiludir o seu
irmão, Leon não quer desiludir mais ninguém à sua volta com os seus erros do
passado. E para onde é que isso o vai levar?
Agora vamos ver um Campeão fora das
suas funções, algo que eu próprio não tinha planeado, confesso. Penso que será
um arco interessante para explorarmos um pouco melhor o ponto de vista de Leon
e aquilo que ele realmente sente.
Capítulo 30
O Pokémon Center de Hammerlocke
despertava bem cedo. A meio da manhã, Victor, Gloria e Hop ocuparam uma mesa no
café do estabelecimento. Os três jovens tomavam a primeira refeição do dia
enquanto colocavam a conversa em dia.
- A verdade é que eu não esperava
que ele me pudesse ajudar tanto. Mas o Bede foi responsável pelo treinamento do
Toxel e a captura da Bounsweet. - comentou o gémeo, antes de levar a caneca de
chá aos lábios.
- O quê?! Tens uma Bounsweet?! - o
moreno ia cuspindo uma das suas torradas.
-
Sim. Foi um dos desafios da Wild Area.
-
Eu também apanhei um Swinub. O pequenote andava perdido e esfomeado entre a
neve.
-
Que querido! - exclamou a jovem, com resquícios de chocolate quente nos lábios.
- A atmosfera da Wild Area é mesmo de loucos, não acham? Eu encontrei o
Helioptile durante uma tarde ensolarada.
-
Portanto todos nós capturámos novos Pokémon durante a nossa passagem pela Wild
Area! - exclamou Hop. - Fantástico.
-
É o local com mais diversidade de Pokémon em Galar. Faz sentido. - concordou
Victor.
-
Também enfrentámos um Barbaracle numa Max Raid Battle. - apontou Gloria. - Foi
algo assustador.
-
Pelo menos não foi com a Team Yell. - contrapôs o moreno.
-
O quê?! - os olhos do gémeo abriram-se com força.
- Sim. Eu e a Sonia decidimos entrar
numa Max Raid Battle. E quando nos apercebemos estávamos ao lado daqueles
patifes.
- Que aleatório. - comentou a
rapariga.
- Enfrentámos um Mandibuzz com a
ajuda do Roggenrola gigante. Foi épico! - exclamou com entusiasmo.
- Estamos a ficar cada vez mais
fortes para o Gym Challenge. apontou Victor.
- Mal posso esperar para enfrentar
os próximos Líderes de Ginásio. A partir de agora, vai ser tudo mais
desafiante! - afirmou o moreno.
- O que acham se eu quiser explorar
outros interesses, para além do Gym Challenge?
A atenção dos dois rapazes voltou-se
para a figura de Gloria, que os observava com curiosidade.
- Vais desistir do Gym Challenge? -
questionou Hop.
- Não. Acho que não.
- O que queres dizer com isso?
A rapariga remexeu-se na cadeira.
- Tenho andado a pensar. O Gym
Challenge é demasiado exigente… parece que não podemos fazer mais nada. Sinto
que estamos a seguir um padrão que nos foi imposto. E eu quero fugir um pouco
desta tradição. - explicou. - Acho que não quero desistir. Mas quero tentar
outras coisas.
- O que tens em mente? - perguntou
Victor, com um tom doce e curioso.
- O trabalho da Sonia deixa-me
bastante empolgada. Investigar coisas, fazer novas descobertas, ajudar as
outras pessoas.
- Tu podes fazer tudo aquilo que
quiseres. - sorriu o gémeo, pousando a sua mão por cima da mão da irmã. - Terás
sempre o meu apoio.
- Tenho a certeza que vai correr
tudo bem, Gloria. - concordou o moreno. - Mas quero continuar a ver-te
enfrentar os Líderes de Ginásio com toda a garra.
- Isso significa que…
- Bom dia!
A voz de Sonia encheu o café do
Pokémon Center. Os três jovens voltaram-se, encontrando a figura da ruiva,
acompanhada de Bede e Marnie. O jovem platinado acenou ao grupo e a
especialista em Dark-Type esboçou um
sorriso. Victor deixou escapar um suspiro ao perceber que, mais uma vez, aquela
conversa entre os três voltara a ser interrompida.
- Isso é tudo por me veres? -
murmurou Bede, com um sorriso de lado.
- Querias. - Victor meteu a língua
de fora e fitou o rosto provocador do outro.
- Andávamos à vossa procura. - falou
Marnie.
- Encontraram-nos! - sorriu Gloria.
- Vou visitar um amigo. - falou
Sonia. - Pensei que quisessem vir comigo. Acho que vão gostar de o conhecer.
- Quem? - questionou Hop.
• • •
O
local era rodeado por paredes encarnadas. O símbolo de um dragão vermelho e
azul estava desenhado na parede em frente ao balcão de receção, onde uma jovem
atendia uma dupla de Treinadores Pokémon. O átrio de entrada era decorado com
sofás, móveis e prateleiras escuras, onde reluziam diversos troféus que
relembravam vitórias passadas.
-
Por favor, nós queremos enfrentar o Raihan! - a voz esganiçada de Klara
fazia-se ouvir.
-
Lamento, mas ainda não se encontram prontos para desafiar o Líder de Ginásio de
Hammerlocke.
-
Como pode dizer umas coisa dessas!? - Avery estava estupefacto. - Primeiro
deveria testar as nossas capacidades enquanto Treinadores Pokémon.
-
São as regras. - respondeu a funcionária, devolvendo os cartões de
identificação aos dois.
-
O que se passa?
Naquele
momento, Sonia atravessava a porta de entrada, acompanhada pelos cinco jovens.
Todos se entreolharam, curiosos por se voltarem a reencontrar.
-
Queremos desafiar o especialista dos Pokémon Dragon-Type! - exclamou a rapariga de cabelo rosa.
-
Aparentemente, não estamos à sua altura. - protestou o outro.
-
Oh. - soltou a ruiva.
-
Isso é porque precisam de sete Badges para enfrentar o desafio do Hammerlocke
Stadium. - uma voz grossa fez-se ouvir.
Todos
se voltaram para encontrar a figura de um jovem rapaz, alto, moreno e elegante.
O seu cabelo laranja fazia sobressair os olhos verdes que observavam os
curiosos à sua frente. Vestia um casaco amarelo, azul-escuro e laranja. Os
calções que usava eram coloridos nos mesmos tons, assim como as sapatilhas de
cano alto. Aquele era o uniforme utilizado pelos admiradores de criaturas Dragon-Type.
-
Raihan!
Sonia
saiu disparada na direção do rapaz, abraçando-o com força. O Líder de Ginásio
retribuiu o gesto amigável, envolvendo a amiga num longo cumprimento.
-
Querida Sonia. Como estás tu? - perguntou, observando o rosto da ruiva com
genuína atenção.
-
Estou bem! E tu? Demasiado famoso para passares um bom bocado com a tua amiga?
-
Tenho sempre tempo para ti. - sorriu. - Já tu parece que tens as mãos ocupadas.
- voltou-se para os restantes presentes.
-
Olha bem para eles. No futuro terás de lidar com cada um destes Treinadores
Pokémon. - brincou. - Victor. Gloria. Hop. Bede. Marnie. Avery. E Klara. -
falava enquanto apontava para cada um.
-
Reconheceria esses traços característicos em qualquer lado. - anunciou,
concentrando a atenção no jovem moreno. - Hop. O irmãozinho do Leon!
-
Parece que sim. - respondeu o outro, sem entusiasmo.
-
O Leon falava tanto de ti! Que bela surpresa conhecer o irmão caçula do meu
maior adversário.
-
É um enorme gosto. - retribuiu educadamente. - Um dia irei domar esses Dragon-Type.
Raihan
deixou escapar uma gargalhada. Os seus olhos pareciam brilhar.
-
Vejo que a competitividade é um traço de família.
-
Ainda não viste nada. - provocou o moreno, sorridente.
-
Mas por que razão podemos apenas desafiar o Hammerlocke Stadium depois de
conquistarmos sete Badges? - questionou Avery.
-
São as regras do Gym Mission e da Pokémon League. Como sabem, os diversos
Líderes de Ginásio de Galar estão organizados pela sua força. Apesar de
sugerirmos uma determinada ordem, qualquer um de vocês pode adotar uma
estratégia diferente. - fez uma pausa. - Mas eu, o especialista em Dragon-Type, sou o único Líder de
Ginásio que detém uma ordem específica.
-
O último lugar. - falou Klara.
-
Exato. Sou o último obstáculo que devem enfrentar antes de se qualificarem para
a Pokémon League de Galar. E garanto-vos que não será tarefa fácil.
-
Gostava de ver isso. - Bede deixou escapar um pequeno riso, penteando o seu
cabelo enquanto pensava nos seus companheiros Fairy-Type.
-
Controla-te. - murmurou Victor, dando uma cotovelada discreta ao rapaz.
-
Vamos todos dar o nosso melhor para combater no futuro, Raihan! - exclamou
Marnie.
-
Podemos falar sobre o que realmente interessa? - interrompeu Sonia. Viemos aqui
para visitar o Hammerlocke Vault.
-
Certo. - assentiu Gloria. - É mesmo aqui?
-
É sim. - garantiu o Líder de Ginásio. - Devemos conhecer o mundo Pokémon pela
sua história. Por isso mesmo, decidimos requalificar este edifício que
funciona, em simultâneo, como átrio de entrada para o Gym Mission de
Hammerlocke, mas também para o Hammerlocke Vault. - explicou. - Eles vêm
comigo. - anunciou para a jovem que permanecia atrás do balcão.
Raihan
conduziu o grupo até uma grande porta de madeira, trancada com um leitor
magnético.
-
Precisamos de pagar para visitar o local? - questionou o gémeo.
-
Não. Mantemos os monumentos que contam a história de Galar acessíveis para
todos, independentemente da sua situação económica. Afinal, é a história de
todos nós.
-
Necessitamos apenas de uma autorização. - completou a ruiva. - Mas nós estamos
bem acompanhados.
Raihan
sorriu e passou o seu cartão de identificação pelo leitor. A porta
destrancou-se e o grupo passou para o outro lado, atravessando um corredor
construído em pedra. Nas paredes, várias tochas de fogo iluminavam o caminho.
-
Estamos no interior do antigo Hammerlocke Castle. Ou aquilo que restou dele. -
falava, enquanto caminhava calmamente.
O
local era frio e as passadas de todos os jovens ecoavam pelas paredes que
guardavam histórias centenárias. Victor e Gloria observavam tudo com atenção. O
grupo subiu vários lanços de escadas e depois voltou a parar em frente a outra
porta.
-
É aqui? - a curiosidade de Hop era partilhada por todos os outros.
-
Não. Mas desfrutem. - disse Raihan, antes de abrir as portadas.
Agora
encontravam-se no exterior do antigo castelo. Estavam num patamar mais elevado,
o que lhes permitia ter uma vista privilegiada da cidade. Ao longe, atrás das
muralhas que rodeavam Hammerlocke, conseguiam distinguir as paisagens naturais
da Wild Area. Sonia suspirou e deixou-se absorver por aquele instante.
-
É lindo. - murmurou.
-
Chega a ser difícil acreditar em tudo aquilo que se passou aqui. - comentou
Raihan, num tom de voz baixo, ao seu lado.
-
É a nossa história. Recordar
para não repetir.
O grupo de jovens continuou o
percurso. Victor e Gloria espreitavam pelas frestas das muralhas, observando as
pessoas que passavam mais abaixo. Hop corria, ansioso por descobrir a entrada
para o monumento. Bede e Marnie seguiam em silêncio, admirando o local. Avery e
Klara sussurravam alguma coisa que mais ninguém percebia.
- É aqui! - gritou o moreno, com os
braços no ar.
Hop
apontava para uma porta construída em pedra e madeira. Todos se aproximaram,
encontrando uma tabuleta com os mesmos materiais, onde se esculpiam as palavras
“Hammerlocke Vault”. Raihan assumiu a dianteira do grupo. Levou a mão ao bolso
e retirou uma grande chave de ferro, que enfiou na ranhura da porta. Precisou
de usar as duas mãos e a força do seu corpo para a abrir. As civilizações do
passado gostavam de manter os seus monumentos históricos bem protegidos.
Todos
entraram no cofre redondo. O interior do edifício era todo construído em pedra.
A abóbada no teto deixava passar alguma luz natural para o local, iluminando os
quatro tapetões expostos na parede em meia-lua. Raihan e Sonia aproximaram-se
do centro, deixando os mais jovens de costas para a porta.
- O Hammerlocke Vault conta a
história do The Darkest Day, que aterrorizou toda a população de Galar há três
mil anos. - começou Raihan. - Através desta tapeçaria, preservada pelas
diversas gerações da família real de Galar, conseguimos fazer uma interpretação
dos eventos trágicos.
Duas figuras centrais surgiam nos
quatro elementos que compunham a grande tapeçaria. Uma envergava vestes azuis e
outra usava roupa vermelha. Os seus cabelos eram morenos e de tamanhos
medianos. A sua fisionomia não revelava os seus géneros, contribuindo para o
efeito místico de toda a lenda.
A
Investigadora aproximou-se do primeiro tapete e esticou o braço na sua direção.
- A história começa com os Guardiões
de Galar a avistarem a queda de duas Wishing Star.
O Líder de Ginásio posicionou-se em
frente à segunda figura.
- Segue-se um desastre de proporções
nunca vistas. Os dois Guardiões de Galar procuram resolver a situação.
Sonia caminhou a passos apressados
na direção do terceiro tapete.
- Os Guardiões de Galar utilizam uma
espada e um escudo para travar a tragédia que invadiu a região.
Raihan correu para junto da última
figura que compunha a tapeçaria.
- Finalmente. Os Guardiões de Galar.
Os reis de Galar. Admiram a tranquilidade depois da tempestade.
Fez-se silêncio no monumento. Todos
os presentes pareciam assimilar a informação que lhes era fornecida. Estavam
pensativos. Sentiam o impacto de toda aquela história nas palavras dos dois
narradores.
- Contado assim parece tão… simples.
- murmurou Gloria.
- The Darkest Day foi tudo menos
simples. - contrapôs a ruiva. - A força que tomou os céus de Galar transformou
todos os Pokémon em criaturas gigantes que destruíram aldeias, vilas e cidades.
Muitas pessoas perderam as suas vidas.
- Por Arceus! - espantou-se Klara.
- As Wishing Star são responsáveis
pelo fenómeno Dynamax. - apontou Victor. - Foi isso que aconteceu com os
Pokémon, certo?
- Podemos assumir que sim. -
assentiu Sonia. - Mas as proporções foram desastrosas. Os Pokémon estavam
descontrolados. Não conseguiam controlar todo o poder que lhes foram imposto
sem qualquer consentimento.
- Então foi diferente do Dynamax que
conhecemos hoje. - falou Avery.
- Exatamente. - concordou Raihan. -
Atualmente, existem Power Spots em diversas localidades da região de Galar. Mas
no passado, a energia Dynamax espalhou-se sem qualquer controlo.
- Não consigo imaginar Pokémon
gigantes por todo o lado. - murmurou Bede.
- Desde então, o fenómeno Dynamax
tem vindo a ser estudado e dominado por todos aqueles que fazem parte do Gym
Challenge e da Pokémon League. É uma ferramenta segura. - explicou a ruiva.
- Continuam a existir algumas
pessoas contra a sua utilização. - vociferou Marnie. - O meu irmão Piers, por
exemplo.
- Sim. O Líder de Ginásio de
Spikemuth orgulha-se pelo seu método de combate tradicional. - apontou o
especialista em Dragon-Type.
- Esta história. É a mesma que está
representada nas estátuas presentes no Budew Drop Inn, em Motostoke. -
relembrou a gémea.
- Sim. - confirmou Sonia. - Essa
estátua é outro lembrete que nos chegou dos nossos antepassados. Existem várias
homenagens aos Guardiões de Galar, que assumem o seu poder através da linhagem
da família real.
- Sordward e Shielbert. - sussurrou
Victor. - A espada e o escudo.
- Mas falta algo. - afirmou o
moreno. - Não me parece possível que tenham conseguido travar uma tempestade
gigante apenas com uma espada e um escudo.
- Talvez tenham lutado contra os
Pokémon gigantes. - atirou a jovem de cabelo rosa.
- O poder da espada e o poder do
escudo ajudaram a lutar e a proteger a região de Galar. - contribuiu o rapaz da
cartola, movimento as mãos no ar.
- Sim, de facto é curioso. -
concordou a Investigadora. - Não parece razoável que dois humanos tenham
conseguido enfrentar milhares de Pokémon selvagens gigantes e descontrolados.
- Então o que aconteceu realmente? -
o platinado coçava o queixo, pensativo.
- Acredita-se que a espada e o
escudo sejam símbolos para uma força superior. Algo que ainda nos é
desconhecido.
- E a tempestade? De onde surgiu? -
questionou Marnie.
- A origem da energia Dynamax
continua a ser estudada neste exato momento. Como sabem, a Professora Magnolia
concentra os seus estudos nesta matéria. Acredito que teremos algumas
revelações em breve.
- Muito bem, Professora Sonia. -
brincou Raihan, fazendo a amiga corar. - Obrigado pelos esclarecimentos.
- Não foi nada de mais. Todo este
conhecimento está ao alcance de qualquer um. - sorriu.
- Sabem. - o Líder de Ginásio
voltou-se para o grupo de jovens. - Quando o Leon, a Sonia e eu demos início à
nossa jornada, ela sempre foi a mais inteligente de nós os dois. Mas nunca me
conseguiu vencer num combate! - riu.
- Estás a esquecer-te daquela vez
que…
- Isso nunca aconteceu. - cortou.
- Estás a desafiar-me, Raihan?
• • •
O grupo de jovens viajantes
sentava-se nos bancos que rodeavam o pequeno campo de batalha localizado junto
à saída oeste da Hammerlocke. Permaneciam de olhares fixos nos dois
protagonistas daquele momento.
Sonia
e Ivysaur ocupavam um lado do recinto. O Grass-Type
observava atentamente a grande criatura em frente de Raihan. Reconheceu de
imediato o seu antigo companheiro. O corpo azul da tartaruga era protegido por
uma carapaça castanha, equipada com dois canhões no lado superior. Duas orelhas
triangulares permaneciam no topo da cabeça da criatura, colorida em tons de
azul. A parte inferior do rosto e do resto do corpo coloriam-se em tons bege.
Os seus braços e pernas destacavam-se por serem curtos, mas fortes, culminando
em três garras afiadas. A ruiva usou o Rotom Phone para adquirir algumas
informações sobre o adversário.
- Blastoise, um Pokémon Water-Type. - começou o aparelho
eletrónico. - Os canhões no topo da sua carapaça disparam jatos de água capazes
de perfurar metal grosso. Quando se sente ameaçado, Blastoise esconde-se dentro
da própria carapaça.
- É bom voltar a ver-te, Blastoise!
- exclamou Sonia, do outro lado.
- Gosto de guardar o meu Pokémon
Inicial para ocasiões especiais. Habitualmente não é utilizado em combates
oficiais.
- Não é um Dragon-Type. - brincou a ruiva.
- A minha paixão pelos dragões não
diminui o que sinto por este grandalhão. - riu. - Tem um grande valor
sentimental.
- Eu sei. Sinto o mesmo por este
queridinho. - sorriu, observando a figura de Ivysaur.
- Vamos a isto! - Raihan retirou o
seu Rotom Phone no bolso e ativou o modo de gravação em mãos livres. O aparelho
saltou das suas mãos e começou a flutuar à volta das linhas de combate. - Quero
lembrar-me deste encontro mais tarde.
- Muito bem. - assentiu a
Investigadora. - Pelos
velhos tempos!
Sonia esticou o braço à frente do
peito, dando indicação para que Ivysaur avançasse sem hesitação. A criatura
saiu disparada na direção de Blastoise, preparando-se para atacar com Take Down.
- Protect.
O Water-Type deu um salto no ar e escondeu a cabeça e os membros no
interior da sua grande carapaça, que começou a brilhar mesmo antes de ser
atingida pelo Grass-Type. O Pokémon
de Raihan conseguira proteger-se totalmente da investida de Sonia.
- Venoshock!
Quando Blastoise voltou a
reaparecer, o bolbo de Ivysaur brilhou e começou a disparar várias esferas
venenosas na sua direção, atingindo-o em cheio. O Líder de Ginásio esboçou um
sorriso.
- Isso é tudo vontade de vencer? -
provocou. - Não me lembro desta garra toda há uns anos atrás.
- Todos crescemos.
- Tens razão. - assentiu. - Vê se
consegues lidar com isto. Crunch!
O Water-Type aproveitou-se da proximidade para atacar o Grass-Type com as suas fortes
mandíbulas. Ivysaur deixou escapar pequenos grunhidos à medida que as presas do
adversário se espetavam no seu corpo. Finalmente, conseguiu libertar-se, caindo
no chão do campo de batalha.
Os
Pokémon fitaram-se com atenção. Vários anos tinham passado desde que os dois
antigos companheiros se tinham visto. Estavam ambos diferentes: as suas formas
evolutivas davam-lhes características físicas e psicológicas distintas. Mas o
laço de amizade continuava presente. Apesar de, naquele momento, serem rivais.
Ambos sabiam que iriam dar o seu melhor. Fora sempre assim. Seria sempre assim.
Foi dessa forma que os seus Treinadores os educaram.
-
Muito bem. Synthesis.
Ivysaur
fechou os olhos e concentrou-se na luz solar. O bolbo começou a brilhar e,
subitamente, todo o seu corpo começou a reluzir. Pequenas esferas de energia
solar eram absorvidas pela criatura, que recuperava a energia anteriormente
perdida.
- Blastoise, não lhe dês mais tempo!
Aqua Tail.
Aproveitando o estado do adversário,
o Water-Type começou a agitar a sua
cauda no ar, fazendo-a brilhar. Várias espirais de água surgiram à volta da
cauda, que Blastoise arremessou contra o corpo de Ivysaur, fazendo-o despertar
do seu transe. O Grass-Type agitou o
seu corpo, agora encharcado de água.
- Vamos ensiná-los como se faz. Seed Bomb.
O bolbo de Ivysaur começou a reluzir
novamente. Várias sementes esverdeadas começaram a surgir à volta do seu corpo,
sendo imediatamente arremessadas contra a figura de Blastoise, provocando uma
pequena explosão no impacto. O Water-Type
deixou escapar, pela primeira vez, um rugido de dor e frustração. A técnica
super-efetiva começava a demonstrar os seus danos. Sonia sorriu de lado,
orgulhosa.
Se é assim que querem… então é assim
que terão. Recompõe-te e usa Ice Punch!
Blastoise abanou a cabeça, tentando
afastar a dor que sentia em todo o corpo. Depois, começou a correr, de punho
erguido, em direção ao adversário. À medida que dava um novo passo, o seu punho
era irradiado por uma energia gelada. Quando finalmente o membro do Water-Type atingiu Ivysaur, o gelo
atingiu o corpo do Grass-Type,
arremessando-o fortemente contra o chão.
Ivysaur ficou imóvel. O ataque super-efetivo
e o nível de experiência de Blastoise abatiam-se agora sobre a figura do Poison-Type, que sentia um grande
formigueiro no seu corpo. O Pokémon escutou a voz de Sonia ao longe, mas não
conseguia fazer sentido das suas palavras. Achava-se demasiado fraco para
continuar o confronto. Os seus músculos tremiam sem parar e a cabeça andava à
roda. Fechou os olhos, tentando concentra-se e, subitamente, sentiu uma energia
tomar conta de si.
O corpo do Pokémon iluminou-se por
inteiro, à medida que a sua fisionomia ganhava uma nova forma. As quatro patas
aumentavam de tamanho, tornando-se mais fortes e grossas. O seu rosto achatado
dava lugar a dois pequenos olhos encarnados e uma grande mandíbula afiada.
Finalmente, o bolbo nas suas costas florescera, dando lugar a uma grande flor
com um botão amarelo, pétalas rosas, folhas verdes e um tronco castanho.
Os
olhos de Sonia reluziam de tamanho orgulho. A ruiva voltou a retirar o Rotom
Phone da sua carteira, procurando novas informações sobre o Pokémon.
-
Venusaur, um Pokémon Grass-Type e Poison-Type. - anunciou o robô. - A
planta no seu dorso floresce através da energia solar. Um aroma encantador
exala da sua flor, responsável por acalmar todos aqueles à sua volta.
-
Fantástico. - murmurou. - Vamos fazer uso da nova técnica. Petal Blizzard.
Venusaur
concentrou-se por alguns segundos. Múltiplas pétalas rosa começaram a surgir à
volta do seu corpo, rodopiando em múltiplos remoinhos que foram lançados com
forte intensidade contra a figura de Blastoise. O Water-Type caiu de costas e deixou escapar altos grunhidos. Todo o
seu corpo estava ferido depois dos grandes danos provocados.
-
Blastoise!
A
voz de Raihan gritou por todo o local, mas a criatura parecia não ouvir. Os
seus rugidos continuavam e a dor parecia não desaparecer. Os olhos da criatura
tornaram-se azuis e, de súbito, o Líder de Ginásio esboçou um sorriso de lado,
como se soubesse o que se seguiria. O Pokémon levantou-se e focou-se unicamente
na figura de Venusaur. Sonia estremeceu quando percebeu o estado alterado do
adversário.
-
O que se passa?!
-
Parabéns. Acabaram de ativar a habilidade do Blastoise. Torrent, responsável por aumentar os ataques Water-Type.
-
O quê!?
-
Lidem com isto! Aqua Tail.
A
cauda da grande tartaruga começou a brilhar e vários remoinhos de água surgiram
à sua volta, sendo logo de seguida arremessados contra o corpo de Venusaur com
uma intensidade muito superior à de anteriormente. O Grass-Type tentou esquivar-se, mas acabou por sentir o forte embate
contra todo o seu corpo.
-
Venusaur! - gritou Sonia. O Pokémon parecia em sofrimento depois do choque com
a água gelada.
-
Vamos terminar com Ice Punch! Máxima
intensidade!
Sem dar mais tempo ao adversário,
Blastoise concentrou toda a sua energia naquela técnica. Recomeçou a corrida na
sua direção, erguendo o punho que começava a envolver-se em gelo cristalizante.
Logo a seguir, atingiu o rosto de Venusaur com forte impacto, fazendo o Pokémon
Inicial de Sonia dar uma pirueta no ar, aterrando de patas para o ar.
O
Grass-Type perdeu de imediato a consciência,
dando a vitória automática a Blastoise e Raihan, que já festejavam abraçando-se
mutuamente. Apesar de toda a força revelada, o Water-Type demonstrava uma grande ternura pelo seu mestre. Do outro
lado, Sonia ajudava Venusaur a despertar e a compor-se.
-
Venusaur. Amigo. - murmurou, com os olhos brilhantes. - Foste fantástico.
Obrigado. - sorriu.
O
Pokémon soltou pequenos grunhidos e a ruiva sabia o que aquilo significava.
Ambos levantaram o olhar para o lado oposto do campo de batalha, encontrando as
figuras dos dois rivais. Sonia e Raihan cruzaram olhares simpáticas enquanto
Venusaur e Blastoise se cumprimentavam com acenos de cabeça. O companheirismo
ainda se fazia sentir entre todos.
-
Acho que devíamos marcar este momento para sempre. - atirou Raihan. - Vamos
tirar uma selfie? - perguntou, antes
de provocar uma grande gargalhada à antiga companheira de viagem.
• • •
- Como é que não estás triste por
teres perdido o combate? - a voz de Hop destacava-se no meio do Pokémon Center.
- Nem tudo é sobre ganhar. - afirmou
Sonia, que virava costas ao balcão do estabelecimento, depois de entregar a
Poké Ball à Enfermeira Joy. – Além disso, agora tenho um fantástico Venusaur!
- Gosto desse espírito. - concordou
Gloria.
- Vencer confrontos Pokémon não é o
meu propósito de vida. - explicou a ruiva. - As minhas prioridades são outras.
- Foi um confronto amigável, mas
bastante interessante de testemunhar. - apontou Victor.
- Sim. - concordou Bede. - O Raihan
demonstrou o seu potencial enquanto Líder de Ginásio.
- Enfrentá-lo deve ser magnífico! -
falou Klara, deslumbrada.
- Temos um longo caminho a percorrer
antes de o podermos fazer. - relembrou Avery.
- Aproximam-se novos desafios. -
falou a jovem de Spikemuth. - E chegou a hora de continuar em frente.
- Para onde vais a seguir? -
perguntou o moreno, curioso.
- Vou treinar um pouco na Wild Area.
- Parece-me bem. - apontou Bede. -
Eu ainda tenho alguns assuntos por tratar em Hammerlocke antes de seguir para o
próximo destino do Gym Challenge.
- Oh. - murmurou a rapariga. - Vamos
seguir por caminhos diferentes.
- Não me digas que estás com medo de
voltar à estrada sozinha. - brincou o platinado.
- Nada disso. - Marnie meteu a
língua de fora. - Mas sei que vais ter saudades minhas.
-
Quem te dera. - Bede esboçou um pequeno sorriso. - Vemo-nos em breve.
-
Da próxima vez, vou desafiar-te para um combate. Prepara-te.
-
Perfeito.
Marnie
envolveu os seus braços à volta do corpo de Bede. O rapaz não reagiu. Manteve
os seus braços ao lado do tronco, surpreso com aquele gesto. Marnie sabia que o
companheiro tinha um temperamento frio, mas tinha a certeza que o seu coração
começava a aquecer aos poucos. A jovem afastou-se e voltou-se para os restantes
elementos presentes.
-
Até à próxima! - e sorriu, antes de se voltar para a saída do estabelecimento.
-
Devíamos fazer-nos à estrada também. - apontou o apaixonado por Psychic-Type, remexendo a sua cartola.
-
Não! - protestou a rapariga de cabelo rosa. - Recuso-me a acampar novamente no
meio da natureza!
-
Vá lá, Klara. Tu sabes que os nossos acampamentos são sinónimo de receitas
deliciosas feitas por mim. - sorriu.
-
Acho que tens razão… podemos arranjar marshmallows
outra vez?
-
Tudo o que tu quiseres.
Os
dois amigos despediram-se dos restantes elementos e cruzaram as portas do
Pokémon Center enquanto discutiam a próxima receita que iriam confecionar
juntos.
-
Acho que vou aproveitar a deixa. - falou Sonia. - Vou até ao meu quarto.
-
Espera, Sonia. - pediu Bede, antes que a ruiva pudesse dar um passo. - Posso
falar contigo? - perguntou. - A sós.
A
jovem mostrou um ar surpreso.
-
Oh. Sim. Claro!
-
Boa. - assentiu, antes de se voltar para os outros três. - Mantenham-se em
forma, sim?
-
Podes crer! - exclamou Gloria.
-
Obrigado pela ajuda na Wild Area, Bede. - a voz de Victor saiu num tom firme.
- Não fiz nada de mais. - respondeu.
- Eu é que agradeço. - e esboçou um sorriso, que surpreendeu todos os
presentes.
- Encontro-vos mais tarde! - disse
Sonia, antes de subir para o andar superior do edifício com Bede.
Victor, Gloria e Hop
entreolharam-se, confusos e curiosos com toda a situação. Desde aquela manhã,
era a primeira vez que estavam os três a sós.
- O Bede acabou de sorrir? Para ti?
- balbuciou o moreno.
- Não sei. Acho que sim. - Victor
encolheu os ombros, tentando esconder as bochechas vermelhas.
- Isso não interessa. - contrapôs a
jovem. - O que será que ele quer falar com a Sonia?
- Algo pessoal. Talvez. Devíamos
respeitar isso.
- Um pouco de curiosidade nunca fez
mal a ninguém. - opinou Hop.
-
Seja como for. Vou buscar o Dottler.
-
Jantamos juntos? - perguntou o gémeo.
• • •
A porta do Power Plant abriu-se
automaticamente, deixando a figura de Gloria atravessar para o interior do
edifício. A jovem percorreu o corredor a passos largos. Sentia-se ligeiramente
ansiosa por reencontrar Dottler. Deixar o seu Pokémon nas mãos de outras
pessoas era algo a que a rapariga não estava habituada. Mas esforçara-se para
conseguir dar uma oportunidade ao Bug-Type
para explorar os seus interesses e sentia-se orgulhosa por isso.
Oleana aguardava-a no átrio central
do edifício. Esboçou um pequeno sorriso ao encontrar o rosto de Gloria, que
também se iluminou.
-
Bem-vinda, de novo. - cumprimentou a mais velha.
-
Olá. - saudou Gloria, observando em volta. - Onde está o Dottler?
-
Queria que visses pelos teus próprios olhos. - falou a mulher. - Ali dentro. -
apontou para a porta de vidro que dava para o interior de um dos laboratórios.
A
jovem aproximou-se calmamente da porta, espreitando o seu interior. Vários
cientistas ocupavam diferentes bancadas de trabalho. Um grupo de jovens rapazes
tiravam apontamentos de um quadro digital, um grupo de raparigas colocavam
líquidos multicoloridos em tubos de ensaios e duas cientistas com mais
experiência lavavam diversos balões volumétricos. Dottler permanecia em cima de
uma bancada de trabalho, acompanhando um senhor que espreitava por um
microscópio. Os olhos do Pokémon reluziam num tom encarnado que refletia o
interesse e a curiosidade que sentia.
-
Oh. - Gloria deixou escapar. - O Dottler está mesmo concentrado.
-
E feliz. - apontou Oleana.
-
Está mesmo. - concordou a jovem. - Mas eu já tenho tantas saudades.
-
E ele também. No início da manhã, estava ligeiramente perdido. Agora já está
mais entusiasmado.
Gloria
suspirou. Sentia-se ligeiramente aliviada por saber que o seu Pokémon também
sentira a sua falta. Podia ser uma sensação egoísta, mas não estava pronta para
abrir mão de um elemento da sua equipa.
-
Pode sempre voltar. - disse.
-
Com certeza, gostaríamos muito de o voltar a receber. - o olhar de Oleana
voltou-se para a rapariga. - Espero que o Dottler seja um exemplo também para
ti.
-
Como?
-
O teu Pokémon está a explorar coisas que ele realmente gosta. Para além de
combates e desafios tradicionais. E acho que tu devias fazer o mesmo.
-
Talvez. - respondeu. - Mas o Gym Challenge é tão exigente. Parece que ocupa
todo o tempo que tenho.
-
Eu sei que pode ser cansativo. Mas não deixes que as regras pré-estabelecidas
guiem o rumo da tua aventura.
Gloria
absorveu as palavras de Oleana com atenção. No fundo, ela sabia que aquilo era
verdade. A própria já tinha pensado nessa possibilidade. Mas sentir a aprovação
de um adulto tão influente como Oleana era bastante encorajador.
-
Obrigado. Prometo que vou pensar nisso.
-
Pensa bem. - sorriu. - Agora vou buscar o Dottler. - e abriu a porta
envidraçada, deixando Gloria sozinha com os seus pensamentos.
• • •
Bede
abriu a porta do seu quarto, dando espaço para que Sonia entrasse. O platinado
mantinha o rosto firme enquanto a ruiva parecia cada vez mais curiosa por
aquele encontro. Os dois sentaram-se no sofá da pequena divisão, iluminados por
um candeeiro de pé alto. O ambiente era íntimo e calmo. O rapaz manteve-se em
silêncio durante alguns segundos, antes de soltar um logo suspiro. Precisava de
ganhar alguma coragem para os minutos que se seguiriam. Estava na altura de
começar a deixar cair o seu escudo.
-
Lamento por todo o secretismo. - falou finalmente. - Preciso da tua ajuda,
Sonia.
-
Sem problema. Em que te posso ajudar?
-
Eu sei que trabalhas como Investigadora. E que ajudas a Professora Magnolia.
Penso que és a pessoa mais indicada para esta situação. - a jovem acenou com a
cabeça, mas manteve-se em silêncio. - Não sei se sabes. Mas eu sou órfão. -
deixou escapar um pequeno suspiro e, pela primeira vez, Sonia sentiu empatia
por Bede. - Cresci no Motostoke Orphanage. O Rose e a Oleana deram-me uma
oportunidade única. E é graças a eles que estou aqui hoje.
-
Não fazia ideia, Bede. Lamento muito. - murmurou. - Ainda bem que recebeste
esse auxílio precioso.
-
Sim, obrigado. - respondeu, num tom meigo. - Crescer sem qualquer referência
familiar foi bastante solitário.
-
Bede… - os olhos de Sonia encheram-se de lágrimas. - Como te posso ajudar? -
esticou as mãos, pousando-as nas pernas do jovem.
-
Ajuda-me a encontrar a minha família. Por favor.
• • •
O
escritório de Rose, no interior do Wyndon Stadium, tinha uma vista privilegiada
para o enorme campo de batalha. As bancadas do estádio pareciam tocar o céu
estrelado de Galar. Naquele momento, as luzes de presença do recinto
mantinham-se ligadas, iluminando as linhas do campo.
Leon
permanecia sentado no sofá do escritório. O seu olhar fitava sem grande atenção
o estádio à sua frente. Fora ali que conseguira o maior feito da sua carreira.
Fora ali que a sua vida mudara. As memórias de combates acesos e desafiantes.
Luta, suor, lágrimas. E vitórias, sempre vitórias. Perder não fazia parte do
seu vocabulário.
Entre
o sofá e a parede envidraçada, surgia a secretária do Presidente Rose. O homem
de pele morena estava sentado na grande poltrona. Tinha os cotovelos apoiados
na mesa e as duas mãos agitavam-se no ar.
-
Leon? Estás a ouvir-me?
O
jovem piscou finalmente os olhos, despertando do pequeno transe em que se
encontrava. Voltou o olhar para o homem à sua frente, antes de responder.
-
Sim. Estou aqui.
-
Não, não estás.
-
É claro que estou! - protestou, visivelmente agitado.
-
O teu corpo está aqui. Mas a tua cabeça está noutro lugar qualquer. - Leon
permaneceu em silêncio. - O que se passa contigo?
-
Não sei do que falas, Rose.
-
Os teus últimos desafios são desconcertantes. Não estás no campo de batalha.
Não estás ali! - exclamou o mais velho, apontando o dedo para o recinto do
estádio atrás de si.
-
Continuo a ganhar. Continuo a cumprir os objetivos.
-
Sim. Mas a tua performance mudou. Estás diferente. Dentro e fora de campo,
Leon.
O
Campeão abanou a cabeça, como se estivesse a afastar pensamentos indesejados.
-
Isto é uma intervenção, é isso!? - a sua voz saiu grave antes de se erguer do
sofá, sobressaltado.
-
Estou a tentar perceber o que se passa!
-
Está tudo ótimo! - insistiu.
Agora
que Leon se encontrava de pé, o seu rosto iluminava-se de forma diferente. Os
olhos brilhantes começavam a perder alguma cor. As olheiras pareciam ficar cada
vez mais acentuadas. O cabelo, anteriormente bem cuidado e penteado, parecia
perder o encanto. E as mãos continuavam agitadas.
-
Olha bem para ti. Tu não és o Leon que eu conheço.
O
jovem engoliu em seco. Os seus olhos começavam a encher-se de lágrimas. Mas
conseguiu segurá-las.
-
Não quero falar sobre isto. - disse, finalmente. - Pode ser?
-
Muito bem. - assentiu o Presidente. - Tu sabes que eu sempre fiz tudo para te
ajudar e proteger. Nunca te esqueças disso. Estarei aqui quando quiseres falar.
-
Obrigado.
-
Posto isto, acho que te deves afastar das funções de Campeão. Até te
recompores.
-
Não pode fazer isso, Rose! - protestou num grito.
-
Sei que não consegues ver com clareza agora. Mas irás agradecer-me no futuro.
Não posso arriscar perder o meu Campeão invencível pela força do cansaço.
-
Recuso-me!
Rose
levantou-se da cadeira, deu a volta à secretaria e colocou-se de pé em frente a
Leon. Fitaram-se os dois por alguns segundos. Mantinham uma relação paternal e
profissional há vários anos. Conheciam-se mutuamente. Guardavam recordações,
memórias e histórias em comum. Mas ambos sabiam que muita coisa estava por
dizer.
-
Vou emitir um comunicado. Irei anunciar que o Campeão de Galar tirou um tempo
indefinido de férias. Um momento para estar com a sua família e aproveitar a
companhia dos seus Pokémon de forma descontraída. Parece-te bem? - Rose pousou
a mão no ombro de Leon, que baixou a cabeça em forma de derrota. - Vai para
casa. Traz de volta o meu Campeão. - sussurrou.
• • •
Victor,
Gloria e Hop já se encontravam sentados à volta da mesa de um restaurante de fast-food localizado numa das ruas de
Hammerlocke. Depois dos restantes companheiros partirem em direções distintas,
o trio decidira fazer uma refeição em conjunto, sem interrupções externas.
O
espaço era ocupado por várias mesas e cadeiras. Diversas pessoas entravam e
saíam do estabelecimento. Algumas faziam os seus pedidos e partiam, outras
sentavam-se para refeições rápidas. O ar era ocupado pelo cheiro de
hambúrgueres grelhados e batatas fritas que emanava do interior da cozinha.
Alguns funcionários circulavam apressadamente por entre os clientes, mas o trio
de jovens de Postwick parecia viver à parte de toda a confusão.
-
Estou tão contente por estarmos a fazer isto! - exclamou Gloria, com o menu de fast-food na mão.
-
A última vez que estivemos juntos num restaurante não correu nada bem. -
apontou o gémeo.
-
Tens razão. Por isso mesmo, tínhamos de repetir a experiência. - Hop esboçou um
sorriso.
- Esta é uma versão mais low-cost. - brincou Victor.
- Tenho saudades de comer um
delicioso hambúrguer! - riu a gémea, empolgada.
- E eu tive saudades vossas, amigos.
- o moreno sorriu, recebendo a atenção dos outros dois. - Por isso, espero
poder voltar a juntar-me a vocês na estrada.
-
A sério!? - a rapariga saltou da cadeira.
-
Fantástico! - exclamou o irmão. - Finalmente.
-
Durante algum tempo, senti que não podia confiar em ninguém. Depois do Leon ter
guardado aquele segredo durante tanto tempo, pensei que qualquer pessoa pudesse
fazer o mesmo. E talvez isso seja mesmo possível. Mas não me parece que consiga
continuar em diante sem os meus amigos por perto. - explicou.
-
O encontro entre a Sonia e o Raihan ajudou-te a perceber isso? - a voz de
Gloria era doce.
-
Sim. - respondeu. - Vocês
não merecem que eu desconfie da vossa boa vontade pelo erro de outras pessoas.
Por aquilo que o Leon fez… vocês são os meus verdadeiros amigos. E eu sei disso
porque respeitaram a minha decisão. Por mais maluca que ela pudesse ser. Tal
como o Raihan respeitou a decisão da Sonia há anos atrás. E vejam a amizade que
eles têm agora. Eu quero ter algo assim com vocês. - sorriu e depois deixou
escapar um suspiro de alívio.
-
Claro que te respeitamos. - murmurou Victor. - Precisavas de estar sozinho e
meter os teus pensamentos em ordem.
-
Já sabes o que vais fazer em relação ao Leon?
-
Vou manter distância. - respondeu prontamente. - Não consigo sequer imaginar
estar com ele. Mas penso que o melhor é manter toda a informação que foi
revelada apenas entre nós. Concordam?
-
Claro que sim. Não queremos provocar mais problemas.
-
No meio disto tudo, fico feliz em saber que podemos contar com a Sonia. -
afirmou Gloria. - Podemos confiar nela.
- Sim. - Hop assentiu. - A verdade
é que a Sonia me ajudou bastante durante este período. Com ela percebi que o
melhor para mim mesmo é fazer algo que realmente gosto e me deixa feliz. E,
para mim, não há nada que me deixe mais satisfeito que viajar ao vosso lado.
- Hop… - murmurou o gémeo. - Tu és o
meu melhor amigo. Sabes disso, certo?
O moreno sorriu. Uma lágrima rolou
pela sua bochecha. Mas ele não se preocupou. Deixou que os dois gémeos se
levantassem dos seus lugares, se aproximassem e o envolvessem num abraço
caloroso e confortante. Estava de volta a casa.
A porta do restaurante abriu-se e a figura de Sonia surgiu. A jovem voltou-se para encontrar os três jovens abraçados. Os seus lábios desenharam um sorriso brilhante e orgulhoso. A amizade entre Victor, Gloria e Hop relembrava-a dos tempos vividos com Leon e Raihan. A juventude, a curiosidade, o crescimento, a ingenuidade. Um passado que nunca mais voltaria. Um presente a acontecer. E um futuro por ser vivido.